A vida não avisa quando vai mudar. Não manda um e-mail, não dá um tempo para nos prepararmos. Ela simplesmente vira a esquina e, quando percebemos, tudo já é diferente. O que era certo ontem se dissolve, as amizades que pareciam eternas escorrem pelos dedos, os lugares que eram lar perdem a familiaridade. E, sem que a gente perceba, somos obrigados a nos tornar novos.
"Que a força do medo que tenho não me impeça de ver o que anseio
que a morte de tudo em que acredito não me tape os ouvidos e a boca
pois metade de mim é o que eu grito
a outra metade é silêncio."
Os versos de Oswaldo Montenegro ecoam na minha mente um pedido de coragem. Que o medo não paralise. Que as certezas que desmoronam não nos tornem mudos. Que a gente continue, mesmo sem saber exatamente para onde. Porque, no fundo, a vida se divide assim: entre o que conseguimos dizer e o que fica guardado dentro de nós. Entre o que conseguimos segurar e o que nos escapa.
O medo de mudar é, no fundo, o medo de perder. Porque mudar significa abrir mão, deixar algo para trás. Mas o que assusta não é exatamente a mudança, e sim a incerteza do que vem depois. Só que a vida não espera. Ela acontece no meio do caos, no susto, no instante em que nos jogamos sem ter certeza se o chão vai segurar nossos pés.
A gente se apega ao que conhece. Aos amigos de sempre, aos lugares onde fomos felizes, às versões antigas de nós mesmos. Mas a verdade é que nada fica igual por muito tempo. As pessoas seguem seus próprios caminhos, as cidades mudam de ritmo, e, quando nos damos conta, já não pertencemos mais aos lugares onde antes cabíamos perfeitamente.
E ainda assim, tentamos segurar as coisas. Construímos rotinas, encontramos um grupo, nos encaixamos em um espaço que faz sentido – até que, de repente, não faz mais.
“Um andarilho que corre sobre uma fina camada de gelo. Ele não tem um destino certo. Mas sabe que, se parar, o piso racha e morre afogado” -Ralph Waldo Emerson. O tempo todo nos equilibramos nesse gelo fino, tentando seguir em frente sem afundar. Mas talvez a pergunta mais importante seja: estamos correndo porque queremos ou porque temos medo de parar?
Talvez o medo da mudança venha da ilusão de que existe algum tipo de estabilidade definitiva, um momento da vida em que tudo vai se encaixar e permanecer assim para sempre. Mas a verdade é que não existe um ponto de chegada, apenas uma série de partidas e chegadas. A gente muda de escola, depois de faculdade, depois de cidade, de trabalho, de companhia. Um ciclo que nunca para.
E, no meio disso, tentamos agarrar as pessoas, os momentos, os lugares, como se segurá-los com força fosse suficiente para impedir que escorressem pelos dedos. Mas nada nos pertence de verdade. As pessoas vêm e vão. Os lugares que um dia foram nossos perdem o brilho. As memórias mais vívidas se tornam borrões.
A mudança chega como uma maré. Às vezes, sutil como um sussurro – um amigo que começa a responder menos, um lugar que vai deixando de fazer sentido, um trabalho que já não empolga tanto. Outras vezes, avassaladora – um término, uma demissão, uma mudança de cidade. O tipo de coisa que nos vira do avesso e nos obriga a recomeçar sem aviso prévio.
E se parar não fosse o problema? E se o segredo fosse aprender a patinar nesse gelo, a aceitar a impermanência sem medo, a entender que a mudança não precisa ser uma queda – pode ser um convite?
A verdade é que a gente não precisa ter todas as respostas. Nem sempre dá para saber se estamos no caminho certo. Mas o pior que podemos fazer é nos prender ao que já não faz sentido só porque temos medo do desconhecido.
A mudança dói. Dói perceber que alguém que já foi seu porto seguro agora é só uma lembrança distante. Dói ver uma amizade se desgastar, sem briga, sem explicação, só pelo tempo. Dói entrar num lugar que já foi seu favorito e perceber que não sente mais nada. Mas, se dói, é porque houve algo bonito ali. E, se houve algo bonito, então valeu a pena.
Talvez a gente precise aprender a se despedir sem amargura. A agradecer pelo que foi, pelo que fez sentido enquanto durou. Porque nada nos pertence de verdade. As pessoas, os lugares, os momentos – tudo é emprestado. E, no fim, a única coisa que nos resta é o que carregamos dentro.
O mundo muda o tempo todo. O segredo não é tentar segurá-lo, mas aprender a mudar com ele.
seu texto veio num momento certo, estou acabando a escola, meu amigo vai mudar de país e a outra de escola, os meus tempos líquidos estão escorrendo
saudade é o preço que se paga por momentos incríveis logo então é bom sentir falta e encontrar aconchego nela